terça-feira, 23 de junho de 2009

A OSTRA E O VENTO DAS CIDADES

A OSTRA E O VENTO DAS CIDADES

[no álbum “As Cidades”, de Chico Buarque de Hollanda]

Aquelas 5 notinhas descendo e subindo a escala. Num sopro. “Gotas de inspiração”, disseram os escribas anciãos da antiqüíssima Veja – ano de 1998, dezembro: “O que era um jorro, agora são gotas de inspiração”. Queriam retumbância épica pelas cidades isentas de Sonho.

Quando a mediocridade social interdita as parcerias do artista com os cidadãos, o que ele produz, no máximo, são obras menores. A individualidade do artista democraticamente exilado ainda permite esses pequenos milagres. Mistérios da Sagrada Inspiração!

Mas como dizia, aquelas 5 notinhas subindo e descendo a escala, num sopro, vêm do “Prelúdio para a tarde de um fauno”. Sim, e Debussy também compôs em “La Mer”, um “Diálogo do vento com o mar”. E como a fascinante violência dos mares lhe paralisava os poderes de criação, ilhou-se, para tal, numa dessas cidades onde havia certamente um realejo; logo, as 5 notinhas introdutórias não têm dono. São domínio público. Um presente do vento, como sabem a ostra, os realejos de Claude Debussy, os amoladores de faca, os mares e rios do tempo, o “Espírito que sopra onde quer” e, claro, algumas cidades.

(Mário Montaut)